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quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Dona Canô, mãe de Caetano Veloso e Maria Bethânia, morre aos 105 anos‏



Claudionor Vianna Telles Velloso, 105, a Dona Canô, morreu hoje, em Salvador, após sofrer uma isquemia transitória –os sintomas são semelhantes aos de um AVC (Acidente Vascular Cerebral), devido à falta de sangue em uma região do cérebro.
Dona Canô foi internada há 10 dias no Hospital São Rafael em estado grave.
Em 16 de setembro, quando completou 105 anos com grande festa em Santo Amaro da Purificação (a 67 km de Salvador), onde mora, disse à Folhanão ter medo da morte. “Não tenho, não, meu filho. Acredito em Deus e sempre vivi com a minha família, com pessoas do meu lado, com a casa cheia. Acho que esse é o segredo [da longevidade]“.

FIGURA ILUSTRE
Dona Canô nasceu no dia 15 de setembro de 1907, em Santo Amaro da Purificação, na Bahia. Mãe dos cantores Caetano Veloso e Maria Bethânia, dona Canô se tornou uma das personagens mais ilustres de Santo Amaro e do próprio Estado da Bahia.
Casou-se em 1930 com José Teles Velloso, mais conhecido por Zeca ou seu Zezinho, funcionário público dos Correios, que morreu em dezembro 1983, aos 82 anos.
“Eu me casei com vinte e três anos. Eu já conhecia Zeca, através de um amigo dele. (…) Nós íamos todo dia passear na praça. Naquele tempo se passeava muito na praça, hoje não se pode. (…) Quando foi um dia, Zeca disse que ia falar com Papaizinho [pai de D. Canô] e que a gente ia se casar. Eu disse: Oxente!”
O casamento foi marcado com pressa, porque o Zeca ia ser transferido. (…) Nós casamos no dia 7 de janeiro de 1931.” * [trecho de "Canô Velloso - Lembranças do Saber Viver"]
Teve oito filhos, sendo a primogênita Maria Clara, e a cantora Bethânia a mais nova.
“Quando Maria Clara nasceu eu estava com um ano e dois meses de casada. (…) os outros é que vieram, não sei por que, tão ligeiro assim, um atrás do outro. Um atrás do outro não, porque, de Clara para Mabel foram dois anos, de Mabel para Rodrigo não demorou, foram onze meses, de Rodrigo para Roberto cinco anos, de Roberto pra Caetano quatro anos, de Caetano para Bethânia quatro anos. Só de Mabel para Rodrigo foi rápido.”

INFLUÊNCIA POLÍTICA
Dona Canô ganhou mais prestígio em Santo Amaro (BA) do que qualquer político, empresário ou líder religioso da cidade. Na cidade de 60 mil habitantes, localizada no recôncavo baiano (a 71 km de Salvador), ela era considerada mais influente até do que seus dois filhos ilustres, Caetano Veloso e Maria Bethânia.
Em época de eleição municipal era assediada por políticos de todos os espectros, que buscavam seus conselhos. Dona Canô era a primeira a ser ouvida pelo prefeito quando o município precisava tomar uma decisão, e também recebia visitas de empresários que queriam sua bênção para se instalar na cidade.
Sua casa, a de número 179 na avenida Vianna Bandeira, no centro, é ponto turístico de Santo Amaro.

ACM E LULA
Dona Canô possuía uma forte e antiga amizade com o senador Antônio Carlos Magalhães (ACM) e, por extensão, com seu grupo de aliados, que mantiveram a hegemonia do poder no Estado durante décadas. Ela esteve presente na missa em homenagem em homenagem a ACM, que faria 80 em 2007, mas morreu em junho daquele ano.
A amizade que desfrutou com o influente ACM permitiu a dona Canô conseguir diversos projetos de melhoria para Santo Amaro, como a reforma e iluminação da igreja matriz da cidade, ou a construção de um teatro com 380 lugares. O governo do Estado também lhe enviava, sempre que solicitado, doações de artigos como cadeiras de rodas, colchões e agasalhos, que Dona Canô distribuía para centenas de pessoas que se aglomeram na porta de sua casa.

Leonardo Wen/Folha Imagem
Claudionor Viana Telles Veloso, mais conhecida como Dona Cano, em frente a Igreja Nossa Senhora da Purificação, em Santo Amaro, Bahia.
Dona Canô em frente a Igreja Nossa Senhora da Purificação, em Santo Amaro, Bahia.
Apesar de tanta influência, a matriarca dos Velloso era humilde: “Se hoje me reconhecem é por causa dos meus filhos. Eu não sou nada”, afirmou ela em entrevista à Folha, em 2000.
A ligação de Dona Canô com Lula também é notória. Em 2002, nas vésperas da votação que daria a Lula seu primeiro mandato presidencial, ela telefonou ao então candidato, e lhe parabenizou pela campanha, chegando inclusive a cantar o jingle da campanha de Lula no telefone, acompanhada de sua família.

DESAUTORIZANDO CAETANO
Lula também foi o motivo de uma das últimas polêmicas protagonizadas por Dona Canô, em 2009, desta vez envolvendo seu filho. Caetano disse em entrevista ao jornal “Estado de São Paulo” em 5 de novembro, que apoiava a candidatura de Marina Silva à presidência da República, porque ela “é inteligente como o Obama, não é analfabeta como o Lula, que não sabe falar, é cafona falando, grosseiro.”
A declaração obteve grande repercussão, o que fez Dona Canô manifestar intenção de ligar ao presidente para pedir desculpas, em nome de Caetano. “Lula não merece isso. Quero muito bem a ele. Foi uma ofensa sem necessidade. Caetano não tinha que dizer aquilo. Ele é só um cantor. Vota em Lula se quiser, não precisa ofender nem procurar confusão.”

Leonardo Wen/Folha Imagem
Porta-retrato que fica no quarto de Claudionor Viana Telles Veloso, mais conhecida como Dona Cano, em sua residência, em Santo Amaro, a 70 km de Salvador, Bahia.
Porta-retrato que fica no quarto de Dona Cano, em sua residência, em Santo Amaro, a 70 km de Salvador, Bahia
A polêmica foi encerrada poucos dias depois, quando Lula ligou pessoalmente para Dona Canô para perdoar Caetano pela declaração. “Não fique chateada, preocupada, porque gosto muito da senhora e gosto do Caetano também. Está tudo bem, essas coisas acontecem”, disse o ex-presidente.
SINCRETISMO
Religiosa, liderou durante anos a Novena de Nossa Senhora da Purificação, popularmente conhecida como Novena de Dona Canô, tradição católica de quase três séculos que acontece sempre na última semana de janeiro. Essa devoção não a impediu de comandar também as baianas adeptas do candomblé na festa da lavagem da escadaria da igreja.

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